Com a palavra, os cineatas:

“O que interessa não é o que dizemos, mas como dizemos.”(F.Fellini)
"A realidade é chata, mas ainda é o único lugar onde se pode comer um bom bife"(W.Allen)
"Há algo mais importante que a lógica: é a imaginação."(A.Hitchcock)

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Diálogos entre filmes

Atenção: contém spoilers.
Aviso: clique nas falas para assistir a cena no youtube.

A análise de filmes é algo muito legal (acho que todos aqui concordamos nisso), por isso resolvi dar um passo adiante nas minhas análises: no meu primeiro post analisei o mesmo filme que o Lacerdinha para podermos comparar duas análises diferentes; neste queria comparar dois grandes filmes que tem como personagens ao mesmo tempo principais e secundários um mesmo grande ator: Alfredo Pacino.

Sim, minha paixão por ele pode ter influenciado na escolha, mas acho que ela foi mais pautada pelo fato de que eu assisti a esses dois filmes várias vezes – o que facilitará (ou complicará) a minha análise. Estamos falando de Perfume de Mulher (Scent of a Woman) e O Advogado do Diabo (The Devil’s Advocate).

A minha comparação parte do fato de que as personagens principais vividas por Chris O’Donnell e Keanu Reeves possuem diversas semelhanças: ambas criadas sem a presença de um pai consangüíneo (Chris criado por mãe e um padrasto e Keanu por mãe solteira), ambas as personagens tem origem simples (Chris em Oregon e Keanu em um cidade no interior). Além disso, o conflito dos filmes se inicia com a não aceitação do que são.

Em Perfume de Mulher temos um jovem – Chris – que é um excelente aluno que acompanha um ex-oficial do exército – Al – em uma viagem. Logo que se conhecem, porém, percebe-se uma relação tensa entre os dois. Frank (o coronel) é um homem difícil de lidar, – tão difícil que nem a própria família consegue – mas a insistência da mesma que vai passar o feriado de Ação de Graças com a família do marido convence Chris que também precisaria do trabalho para poder visitar a sua no natal.

O primeiro contato entre eles mostra como será a relação dos dois, que possuem opiniões muito diferentes e ao mesmo tempo muito semelhantes sobre o mundo.

Em O Advogado do Diabo, percebemos que um advogado de sucesso (porém novo, como Chris) entra em uma crise por não saber como lidar com um caso aparentemente perdido. A partir de uma escolha: continuar com o julgamento e tentar vencê-lo com qualquer argumento, ele traça sua trama.

Em Perfume de Mulher, Chris é tentado de forma semelhante: ao ver alunos montando uma peça para pregar no diretor, ele se envolve em uma luta sobre o certo e o errado: ele é chantageado com a indicação a um programa de bolsas nas melhores faculdades e tem o feriado para pensar no assunto: se entrega os colegas ou não. Enquanto isso,é chantageado também por amigos e sai com o coronel, mas procura não tocar no assunto (que acaba surgindo inevitavelmente). Essa briga entre o certo e o errado permanece durante o filme todo – cito aqui o que considero a melhor cena do filme – quando o Al Pacino vai se matar e Chris impede. Então Al pergunta porque ele se importa e Chris responde que é porque ele tem consciência, segue-se o seguinte diálogo:

Coronel Frank: Haven't you heard? Conscience is daihed.

Charlie: No, I haven't heard.

Coronel Frank: Well, then, take the fuckin' WAX outta your ears! GROW UP! It's fuck your buddy. Cheat on your wife. Call your mother on Mother's Day. Charlie, it's all shit.

Em O Advogado do Diabo, Keanu escolhe continuar o julgamento, o que desenrola vários fatores, mas alcança glória e prestígio social (coisa que Chris não consegue). A discussão no Advogado vai para o lado do esquecimento, de como as pessoas são capazes de esquecer umas as outras ao mesmo tempo em que acreditam que estão fazendo o que é melhor para elas. Há essa falta de diálogo entre Keanu e a esposa que leva a destruição das suas vidas. Ao mesmo tempo, a glória de Keanu parece desmoronar e quando Al conta a ele tudo o que pensa sobre o mundo em que vivem (semelhante ao caso de Perfume, só que neste, Al não quer a morte, mas a reprodução). Vejamos o diálogo:

John Milton: Let me give you a little inside information about God. God likes to watch. He's a prankster. Think about it. He gives man instincts. He gives you this extraordinary gift, and then what does He do, I swear for His own amusement, his own private, cosmic gag reel. He sets the rules in opposition. It's the goof of all time. Look but don't touch. Touch, but don't taste. Taste, don't swallow. Ahaha. And while you're jumpin' from one foot to the next, what is he doing? He's laughin' His sick, fuckin' ass off! He's a tight-ass! He's a SADIST! He's an absentee landlord! Worship that? NEVER!

(…)

Kevin Lomax: What about love?

John Milton: Overrated. Biochemically no different than eating large quantities of chocolate.

(comentário: me arrepio toda a vez que vejo essa cena)

O pessimismo das personagens de Al Pacino nesses dois filmes é uma constante, porém, segue com ele uma espécie de carpe diem, onde fazer tudo – principalmente o proibido – é a melhor forma de viver. Enquanto as personagens de Chris e de Keanu são personagens que não se aceitam como são e procuram ser maiores agindo de maneira que não agiriam normalmente. Acho que a questão toda é o conceito de grandeza. Nos dois casos a grandeza é mostrada como o poder aquisitivo e, no final dos dois filmes há uma mudança dessa idéia.

Mas afinal, o que é a grandeza?

Em O Advogado do Diabo é fazer o que é certo? Ou é fazer o que é certo e não ganhar nada com isso?

Em Perfume de Mulher é manter a integridade? Mesmo que perca coisas importantes para a sua vida?

Embora os dois filmes tenham abordagens bem diferentes, no fundo eles tratam do mesmo assunto: a moral e a sua relação com o indivíduo: a consciência. Moral aqui, não como sinônimo de ética, mas como atitudes que seguem determinadas regras – no caso, regras que o indivíduo recebeu e internalizou como certas, podendo, é claro, modifica-las ao longo de sua vida. As escolhas podem ser contra a moral recebida, porém, em algum momento a escolha que não foi coerente com a sua moral começa a te atormentar – como é o caso do Advogado do Diabo.

Acho que o aprendizado mais importante desses dois filmes é que não importa o quanto as outras pessoas interfiram nos acontecimentos da sua vida, a escolha sobre o que fazer ou deixar de fazer é sempre sua. E é ai que entra a consciência, que morta ou viva não pára de atormentar ou consolar os homens.

É isso.

terça-feira, 14 de julho de 2009

Os Incompreendidos


Normalmente, quando algum acontecimento importante completa uma idade múltipla de cinco a imprensa, através dos seus muitos veículos, corre para produzir especiais, matérias longas e assim por diante. Normal. No entanto, a Nouvelle Vague completa em 2009 cinqüenta anos (tem dois cincos aí) e eu realmente esperei um barulho muito maior.

A data escolhida é 1959 por causa do lançamento e consagração no Festival de Cannes do filme Os Incompreendidos, no original, Les 400 Coups, de François Truffaut.

Nouvelle Vague, Nova Onda, é o nome dado à tendência do cinema francês que surgia com diretores como Truffaut, Jean-Luc Godard, Claude Chabrol e Alan Resnais. Eu li muita informação contraditória sobre ser ou não um movimento oficial, com manifesto e tudo mais, porém todos propunham, pelo menos no início e entre outras coisas, o "cinema de autor", ou seja, o diretor era o responsável pelo resultado final. Ou algo assim.

Repercussão realmente teve: matéria de várias páginas no Estadão, programa na Globonews, mostra na Cinemateca, e ficam todos discutindo o que sobrou da Nouvelle Vague no cinema atual; discussão idiota. Eu me chamo Elisabeth, de 2006 e Stella, de 2008 (em exibição) são verdadeiras homenagens a Os Incompreendidos, com referências óbvias demais para serem coincidências e acabam de cara com esse debate.

Antoine Doinel é o herói do filme. Ignorado por todos os adultos a sua volta - pais e professores - o garoto, praticamente adolescente, comete pequenos delitos em busca de atenção e em alguns momentos até redenção. Doinel pouco consegue com esses crimes, isola-se cada vez mais e aumenta seu sofrimento na mesma proporção.

François Truffaut é Antoine Doinel. O próprio já declarou que as situações do filme aconteceram com ele mesmo ou com alguém muito próximo. O personagem, que depois teria mais três filmes e um média, é sempre interpretado por Jean-Pierre Léaud: "seu filho acabou de passar aqui!" disseram uma vez para Truffaut.

O título orginal Les 400 Coups é uma alusão à expressão "faire les quatre cents coups", que significa algo como "viver uma vida desregrada" ou "fazer arruaça". Rebeldia, portanto. A mesma rebeldia da infância e adolescência de Truffaut que deu origem a Antoine Doinel e que, mesmo que ele não queira, acaba regendo sua vida.

É um dos filmes mais melancólicos que eu já vi, principalmente por mostrar como a juventude pode ser solitária e extremamente dolorosa. A cena final sintetiza essa solidão e é tão icônica que até foi reproduzida nos Simpsons, veja só.


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As aventuras de Antoine Doinel:

  • Os Incompreendidos (Les 400 Coups, 1959)
  • Amor aos 20 anos - Antoine & Collete (média-metragem, 1962)
  • Beijos Proibidos (Baisers Volés, 1968)
  • Domicílio Conjugal (Domicile Conjugal, 1970)
  • Amor em Fuga (L´Amour en Fuite, 1979)


quarta-feira, 1 de abril de 2009

A Montanha dos Sete Abutres

Shownalismo. Não, não estou falando do Fantástico nem do Cidade Alerta. A questão da interferência da imprensa em casos polêmicos como os episódios do ônibus 174, de Isabela e de Eloá é debatida já em 1951, ano de lançamento de A Montanha dos Sete Abutres.

O filme de Billy Wilder, o mesmo diretor de Crepúsculo dos Deuses, conta a trajetória de Charles "Chuck" Tatum (Kirk Douglas), um jornalista decadente que consegue um emprego no jornal da pequena Albuquerque. A caminho da cobertura de um evento pequeno (do ponto de vista de Chuck), ele e Herbie Cook (George Arthur) encontram um furo de reportagem: um homem (Leo Minosa, intepretado por Richard Benedict) soterrado sob a Montanha dos Sete Abutres na cidade vizinha.

Tatum, acreditando que seria uma matéria e tanto, manipula todo o entorno do caso para que este se prolongue o suficiente para se promover como jornalista, envolvendo a família de Leo, o engenheiro responsável pela obra, o médico, o xerife e a esposa da vítima, Lorraine (Jan Sterling).

Questionamento duro à imprensa e a seus leitores, A Montanha dos Sete Abutres foi um fracasso de público e crítica. Numa tentativa frustrada, o nome original do filme (Ace in the Hole) foi mudado temporariamente para "The Big Carnival". O título em português leva à uma reflexão: quantos são os verdadeiros "abutres" envolvidos no caso da Montanha?

Billy Wilder mais uma vez surpreende levantando com sutileza fortes debates que continuam muito atuais. Infelizmente, o filme só está disponível em DVD nos EUA. Por que? A imprensa brasileira não está preparada para ouvir (de novo) fortes críticas ao seu sistema? Quem são os abutres da nossa montanha?

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Gone with the wind

Começando pelo começo: imagino que o título do filme tenha surgido no sentido de perda, perda das coisas que a protagonista Scarlett sofreu no decorrer da trama. Scarlet começa como uma menina mimada pela família e pelo dinheiro, conhecedora de seu poder de sedução e possuindo um amor obsessivo por Ashley.. Ao longo da trama, conhece o real significado da guerra, perde sua mãe e seu pai enlouquece, o filme então ruma numa direção diferente.
A cena mais impressionante é quando a personagem pega a terra em suas mãos e diz que se tivesse que matar, roubar e fazer o que fosse, faria, mas nunca mais passaria fome de novo. Perguntei-me, após vê-la casar-se com o pretendente da irmã, se causar o sofrimento dos outros seria justificado pelo fato de que ela é uma menina que sofreu muito com as perdas ocasionadas pela guerra.
“O feitiço vira-se contra o feiticeiro” é um ditado que tem um papel importante no filme. Tomada por sua vaidade e por sua obsessão, Scarlett deixa escapar o amor de sua vida, e por conta de seus caprichos e de seu desinteresse acaba perdendo sua filha também.
Não preciso dizer que a elaboração psicológica da personagem foi o que mais me encantou, por esse fato não soube afirmar no final se eu a amava ou a odiava. Scarlett não é nada mais nada menos do que uma pessoa que as vezes cega-se por amor, se envaidece, ou endurece-se nas grandes dificuldades da vida como todos nós, mas acho que a mudança que a guerra causou foi um fator decisivo no caráter dela, como se a realidade fosse encarada por ela pela primeira vez.
Fazendo um comentário ala Lacerdinha, foi impossível não me identificar com scarlet.

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Quadrophenia


A cidade de Londres na década de sessenta era, pra dizer pouco, mítica. Tudo estava mudando bem ali, debaixo dos narizes de todo mundo: a música, a moda, os valores, o comportamento. No olho do furacão estavam os jovens, claro, e quem não teria gostado de fazer parte dessa geração. Afinal, a quantidade de livros sobre o Maio de 68 lançados no ano passado mostra que até algumas pessoas que estiveram lá olham para trás com saudades.

Porém, não são todos que lembram desses anos assim. Um relato bem impressionante sobre um dos lados negros dos sixties é Quadrophenia (de Franc Roddam, 1979). O filme é baseado na terceira ópera-rock dos londrinos do The Who, lançada em 1973 e que levava o mesmo nome. Tanto a história quanto as composições saíram da cabeça do guitarrista, Pete Townshend.

Townhend, assim como seus colegas de banda, eram mods. A palavra vem de "modernists" e designava uma das gangues londrinas da época. Os mods andavam com scooters italianas costumizadas, roupas elegantes e somente ouviam o rock britânico* que começava a aparecer. Aliás, o Who era a banda mais adorada por eles. A outra gangue era os rockers, jovens que lembravam muito Marlon Brando em O Selvagem, com jaquetas de couro, motos de escolta e que ouviam rockabilly e outras coisas dos anos 50. As duas viviam se engalfinhando pela cidade, aterrorizando todo mundo e causando vários estragos por onde passavam.

Quadrophenia é quase um documentário, no sentido de mostrar o que virou parte da geração que cresceu numa cidade que se recuperava da guerra e do que se tratava ser um mod. Estão lá o absurdo das brigas, as drogas (eles adoravam anfetaminas), a imaturidade. O filme pode até parecer algo distante nesse ponto, "um filme sobre jovens londrinos sessentistas". Mas não é. Ele trata, na essência, de assuntos extremamente universais: o amadurecimento e as encruzilhadas em que qualquer jovem um dia irá se encontrará.

O nome do filme/disco é a junção do termo esquizofrenia, que aparece com o significado popular de "múltiplas personalidades", e o "quadro", as diferentes personalidades dos quatro membros da banda. Quadrophenia, em suma, é o protagonista da história Jimmy, um rapaz perturbado e perdido, que poderia ter aparecido em qualquer outra época, mas que no caso, está dando um pouco de realidade à idéia saudosista que muita gente tem dos anos 60.


* Ouça "Dedicated Follower of Fashion" do The Kinks, que também era uma banda dita mod. E ouça o disco do Who, também, mó legal.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Vanilla Sky


Atenção! Spoilers!!

Dia perfeito para ver Vanilla Sky, já que o céu era baunilha.
Confesso que hoje, com o céu branco, ou melhor, baunilha do modo que estava, um despertador com a voz da – ah – Penélope Cruz não me acordaria. Se a Penélope não me acordaria, a Cameron Diaz muito menos.


O filme começa com uma cena que parece mais um run, Tom, run! Meio que uma criança perdida em uma cidade grande... Só que dessa vez, Cameron Crowe não usou crianças. Às vezes as pessoas esquecem que adultos também se perdem, tem medos infantis, como de altura e acho que, apesar de David agir como se fosse uma criança todos sabemos que ele não é (comentário feminino on: com aquele rosto, como poderia?). Ele se apaixona por Sofia pela sua pureza, não é? Mas ao mesmo tempo essa pessoa pura diz que Juliana é “the saddest girl to ever to hold a martini”. Afinal, o quão ingênuo isso é? Que pessoa é mais ingênua que a que se apaixona pela ingenuidade de outra?

Mais um motivo para achar que David age como uma criança... Uma criança que não cresceu por causa da proteção paterna e, agora – de repente – após um acidente de carro (coincidência?) e a conseqüente morte dos pais tem que arcar com o “império” de sua família. Cidadão Dildo, diga, qual é o limite entre o sonho e a realidade? Acho que o filme trata disso principalmente e não de amores perfeitos ou de garotas dos sonhos de alguém – como podemos perceber primeiramente no caso de Brian, o único amigo de David, a garota dos sonhos de alguém muda. Antes, Juliana era a garota de seus sonhos, tratada como amante, para evitar outras palavras, por David, mas logo depois ele conhece Sofia e logo esta é a garota dos seus sonhos. Volúvel talvez? Acho que a vontade de achar alguém tão perfeito para você que qualquer um que tenha pelo menos uma das características que você imaginou, serve e se torna a pessoa que você sempre sonhou. Ou talvez seja tudo dito da boca p
ra fora.

E no fim de tudo, quem é a garota que David sempre sonhou? A garota de Brian será a garota de David? Juliana que, vamos concordar, também o usava para aliviar sua energia acumulada e dizia o amar ou Sofia que aparentemente deu a ele uma noite de amor verdadeiro? Talvez isso, o amor verdadeiro que eles sentiram também tenha sido fruto da imaginação... Enquanto temos a certeza física de que algo ocorreu entre Juliana e David – quatro vezes significa algo -, nada comprova uma relação entre Sofia e David a não ser o depoimento do técnico sobre a vida de David ao menos que consideremos o sonho uma prova...

O sonho lúcido. Grande paradoxo ambulante. Talvez o sonho lúcido tenha começado nessa relação que ele teve com Sofia. A parte lúcida garantia que estava com Sofia e o sonho, o amor verdadeiro com alguém que mal conhecia.

David, a criança que, quando se congelou, escolheu viver protegido por um céu de Monet, o favorito de sua mãe. O céu de sua mãe. Protegido pela sua mãe morta por um acidente de carro e ele, vivendo a vida dos seus sonhos após ser desconfigurado por um acidente de carro que acabou justificando seu medo de altura, afinal, seu rosto ficou marcado após uma queda de uma ponte. Ele programou sua vida, mas seu subconsciente não deixa que ele esqueça de Juliana. Culpa, talvez? Ou talvez Juliana e Sofia tivessem mais coisas em comum do que parecesse. De uma forma ou de outra, ou o sonho ou a lucidez interferiu em seu sonho lúcido que se tornou um pesadelo.

David acaba matando o “amor de sua vida” por pensar que esta era Juliana. E mais uma vez sonho se confunde com a realidade. Porque a vontade de matar Juliana? Sentir-se-ia ameaçado pela sua idéia fixa ou ele não se imaginaria vivendo sem Sofia? Estaria ele bravo porque no fundo sabia que Juliana estava estragando seu sonho?

E quem é Sofia afinal? Cameron ou Penélope? Seriam ambas, Sofia e Juliana, uma pessoa só? E assim sendo, Brian teria apenas uma garota dos seus sonhos? Quem é Sofia? É loira ou morena? Americana ou espanhola? O que é real? O que é real?

Com esse pesadelo, David cria uma figura paterna. Tal como seu pai deveria ter sido. Firme, mas apoiando e mostrando o caminho a seguir. As cenas finais, com ele chamando por suporte técnico e a lição do técnico sobre conseqüências são lições típicas de crianças que começam a aprender a viver. Chama pela ajuda de alguém mais velho, alguém que pudesse guiá-lo.
E afinal, o que é real? Sentimentos são reais? Prazeres são reais? Amigos são reais? Dinheiro, que seu pai dizia ser em grande parte (99%) solução de casos, é real? Acidentes são reais? E a sua eterna indecisão, é real? Quem David ama é real? Ou ele foi apenas capaz de inventar alguém para fugir da sua solidão como mostra o início do filme?

Eu acho que o filme tem uma série de referências bacanas, mas ele viveria bem sem elas, porém o diretor não viveria. Acho Vanilla Sky um filme muito mais profundo e que me provoca muito mais mal-estar que qualquer outro filme do Cameron, mas acho que isso é pessoal, afinal Quase Famosos deixa pessoas que idoltram a vida de Cameron arrepiadas. Pra mim, Quase Famosos é só um filme e Elizabethtown é nível O Amor não Tira Férias, mas Vanilla Sky desafia você a pensar sobre as fronteiras de tudo.


Mas afinal Cameron é um nome unissex?



Vanilla Sky

Amor, ódio, sonhos, vida, trabalho, jogo, amizade, sexo. São essas as palavras escritas na capa do dvd do filme. E é dessa mesma forma que o roteiro é apresentado, como palavras fortes jogadas aleatoriamente e relacionadas entre si. É o tipo “sexto sentido” de filme, ou seja, que faz muito mais sentido na segunda vez que você vê.

Inclusive queria ter visto duas vezes para fazer essa resenha. Eu só tinha duas únicas referências do filme antes de vê-lo hoje. A primeira era o comentário de um amigo: “o pior filme, do melhor diretor”. E a segunda, claro, a cena em que aparecem os peitos de Penélope Cruz. Pra mim, baunilha (chame como quiser) é só um filme incompreendido.

O filme fala de como nunca estamos satisfeitos com a realização dos nossos sonhos. Sempre sonhamos mais. E alguns dos cenários realmente lembram sonhos. Além das ótimas referências (a maioria é até explicada posteriormente) do diretor. O filme todo parece que se passa em outra dimensão. Lembra Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças. Lembra

até o conceito de Matrix. Tudo isso com uma ótima novela de fundo. Pra mim, a atuação de Tom Cruise está ótima, mas há controvérsias.

Sou suspeito pra falar da trilha sonora, pois as músicas escolhidas batem exatamente com meu gosto “rolling stone” musical. E ela muda conforme o filme. No começo, você é conquistado por David Aames e seu estilo de vida. Até a parte que tudo se confunde.

Se você se sentir idiota por não entender nada durante 40% do filme, não se assuste. Acontece com os melhores. E durante esses 40% (a porcentagem varia de pessoa pra pessoa), o filme assume um thriller. Nada muito agradável de se ver.

Mas o doce final compensa. Como o próprio filme diz, o doce nunca é tão doce se você não experimenta o amargo. Com um mix de ficção científica e lição de vida o filme me conquistou. Mas como eu disse, é um filme incompreendido. Ame, odeie ou ignore, o filme é um sonho. Porém cada um interpreta seus sonhos de uma forma. Quatro estrelas.

E eles não parecem querer parar:

"A arte não é só talento, mas sobretudo coragem."(G.Rocha)
"Um homem é um gênio quando está sonhando." (A.Kurosawa)
"Se um ator entra pela porta você não tem nada. Mas se ele entra pela janela você tem uma situação."(B.Wilder)